O anúncio feito pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre a imposição de tarifas a produtos importados de mais de 180 países, gerou um efeito imediato de instabilidade nos mercados globais. Mesmo com a suspensão temporária das medidas por 90 dias, os impactos já se fazem sentir nas bolsas de valores e no clima de incerteza que paralisa investimentos e decisões econômicas em escala internacional.
Para o economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), Giovani Baggio, a insegurança quanto ao futuro é o principal reflexo do tarifaço. Ele relembra que grandes crises, como a financeira de 2008 e a pandemia de covid-19, demonstraram como o “não saber o que vem pela frente” pode travar a economia. Essa apreensão já se reflete em indicadores econômicos que colocam o atual momento em patamares de incerteza superiores aos de outras crises recentes.
O pacote tarifário também consolida uma mudança estrutural no comércio internacional. Segundo Baggio, trata-se da consolidação de um movimento protecionista que já vinha sendo articulado por países europeus na última década, e que agora ganha força com a adesão dos Estados Unidos, tradicionalmente defensores do livre comércio. A adoção desse novo modelo representa uma reconfiguração de sistemas, com impactos sobre a dinâmica global e os atores do mercado.
O temor de uma recessão nos Estados Unidos é outro ponto de alerta. A reação negativa das bolsas globais após o anúncio das tarifas demonstrou o receio quanto aos efeitos da medida sobre a economia americana e, em consequência, sobre o restante do mundo. Baggio lembra que uma retração nos EUA afeta diretamente as exportações brasileiras, com impactos sobre o comércio e a valorização cambial.
Apesar dos riscos, especialistas apontam que há espaço para oportunidades, especialmente para o Brasil, que foi incluído entre os países com alíquotas mais baixas. O presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, destaca que o país pode explorar novos mercados e itens de exportação, mas alerta que é preciso superar entraves históricos, como altos custos de logística e produção. Ele cita o exemplo da China, dizendo que ocupar o espaço deixado pelos chineses é uma possibilidade distante, justamente pela dificuldade de competir em preços.
Para a Fiergs, o momento é oportuno para reorganizar a lógica da produção industrial brasileira. Segundo Baggio, é preciso ampliar a competitividade com melhorias em infraestrutura e qualificação da mão de obra, dois gargalos que impactam diretamente o desempenho das indústrias nacionais.
No campo, o agronegócio brasileiro também sente os efeitos do tarifaço. A valorização do prêmio da soja no mercado internacional, motivada pela dificuldade da China em comprar dos Estados Unidos, traz vantagens ao Brasil. Renan Hein dos Santos, assessor de Relações Internacionais da Farsul, explica que, apesar da quebra de safra no Rio Grande do Sul, o cenário favorece os produtores brasileiros. Com os chineses buscando novos fornecedores, a soja brasileira ganha espaço no mercado. A situação também pode beneficiar outras culturas, como milho e carne, além da indústria de calçados, que tem forte presença no Rio Grande do Sul.
Os reflexos do tarifaço podem ainda alcançar o mercado de biocombustíveis, no qual os Estados Unidos são protagonistas e o Brasil desponta como produtor relevante. A valorização do dólar frente ao real também influencia o agronegócio, com efeitos positivos nas exportações, mas impactos negativos no custo dos insumos agrícolas, muitos deles cotados em moeda estrangeira.
Diante de um cenário de incerteza e reconfiguração global, o Brasil se vê diante do desafio de transformar instabilidade em oportunidade. A depender da capacidade de resposta do país, a crise internacional pode se tornar uma chance de reposicionamento estratégico no comércio mundial.
Com informações: Jornalista Fernando Kopper